O cineasta francês Paul Vecchiali morreu aos 92 anos, anunciou a revista cultural francesa Les Inrockuptibles nesta quarta-feira (18). Conhecido pelos filmes "No Alto das Escadas", de 1983, e "Uma Vez Mais", de 1988, ele teve como pares expoentes da nouvelle vague, como Jean-Luc Godard, Agnès Varda e Jacques Demy.
Apesar de pertencer ao movimento e ser admirado por seus maiores expoentes, ele nunca conquistou o mesmo reconhecimento. Em parte, por causa de seu cinema mais experimental, distante do público.
Chegou até mesmo a fazer uma incursão pela pornografia, com "A Chantagem", de 1975, sobre uma política que é chantageada com um vídeo de sexo do próprio filho. Transgressor, precisou produzir muitos de seus filmes, todos de baixo orçamento.
Por isso, o ofício de produtor também lhe rendeu participações importantes no cinema europeu do século passado. Ele é um dos nomes por trás de "Jeanne Dielman", longa de Chantal Akerman eleito em dezembro como o melhor filme de todos os tempos, pela Sight & Sound. Vecchiali produziu ainda alguns dos primeiros trabalhos de Jean Eustache.
Colaborador da Cahiers du Cinéma, a mais tradicional e conceituada publicação especializada em cinema do mundo, o cineasta nasceu na Córsega, ilha mediterrânea pertencente à França, embora tenha feito carreira em Paris. Começou a vida estudando na Politécnica de Paris e chegou a servir no exército francês na guerra da Argélia. De volta ao país, se encantou com filmes de Jean-Luc Godard e Jacques Demy, o que o inspirou a fazer cinema.
Entre seus filmes estão ainda "À Vot' Bon Coeur", de 2004, "O Ignorante", de 2016, e o curta "Maladie", de 1978, que levou ao Festival de Cannes, e "Noites Brancas no Píer", de 2014, que esteve no Festival de Veneza. Os anos mostram como Vecchiali recebeu reconhecimento tardiamente, décadas após lançar o grosso de sua obra.
Também são dele "O Estrangulador", de 1970, "Mulheres, Mulheres", de 1974, "Réquiem para uma Mulher", de 1979, e "Rosa la Rose, Garota de Programa", de 1986. Além do sexo, outro tema que o cineasta ajudou a normalizar no cinema foi a homossexualidade.
Em "Uma Vez Mais", retratou um homem que põe um fim ao casamento com uma mulher e acaba se apaixonando por outro homem. O longa foi concebido no auge da epidemia de Aids, sendo um dos primeiros a lidar diretamente com o tema, e foi inspirado por discursos homofóbicos de membros do governo francês —Vecchiali, furioso com as declarações, escreveu o roteiro em dois dias.
O filme foi exibido em Veneza e venceu o prêmio da crítica, empatado com "A Última Tentação de Cristo", mas depois foi mal recebido no lançamento na França. Foi o melhor momento de Vecchiali nos festivais. Com "O Ignorante", anos mais tarde, esteve no páreo para a Palma Queer, em Cannes.
Em 2017, Vecchiali veio ao Brasil para a Mostra de Cinema de São Paulo, que o homenageou com uma retrospectiva e com o prêmio honorário Leon Cakoff. Seu último trabalho lançado por aqui foi "Trem das Vidas ou A Viagem de Angélique". Ele deixa "Pas... de Quartier", longa inédito fora da França sobre um cabaret LGBTQIA+.
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