O jornalismo na Rússia vai por um escuro vale. Mais de uma centena de jornalistas, meios de comunicação, defensores dos direitos humanos e ONGs foram recentemente rotulados como “agentes estrangeiros”. Na Rússia, isso significa “inimigos do povo”. Muitos dos nossos colegas perderam os seus empregos. Alguns tiveram que deixar o país.

Alguns são privados da oportunidade de viver uma vida normal por um período de tempo desconhecido. Talvez para sempre… Isso já aconteceu na nossa história.

A 29 de Setembro [de 2022], completam-se 100 anos desde que o “navio dos filósofos” partiu de São Petersburgo para Stettin na Alemanha, um dos muitos em fila, quando os bolcheviques perseguiram quase 300 intelectuais proeminentes da Rússia. O inventor do helicóptero Sikorsky, o inventor da televisão Zvorykin, os filósofos Frank, Ilyin e Pitirim Sorokin estavam a bordo do “Oberbürgermeister Haken” para se exilarem. Entre eles estava também o grande pensador Nikolai Berdyaev. Como outros, ele podia levar os seus pijamas, duas camisas, dois pares de meias e um casaco de Inverno. Foi assim que a pátria se despediu dos seus grandes cidadãos: deixe as suas coisas para trás, mas leve o seu cérebro.

O mesmo está agora a acontecer com jornalistas e defensores dos direitos humanos.

O “navio dos filósofos” foi substituído pelo “avião dos jornalistas”. Claro que é uma metáfora, mas dezenas de jornalistas estão a deixar a Rússia.

Alguns foram privados até mesmo dessa oportunidade.

Discurso de Dmitry Muratov, Prémio Nobel da Paz 2021, a 10 de Dezembro de 2021.